"... E naturalmente o pecado, o bem e o mal, tudo isso são mentiras contadas pelos padres e pelos homens. A única verdade é que crescemos, morremos e desaparecemos como esta folha de grama, aqui. Bem, vou participar da vigília de Gareth, como prometi. Pelo menos, ele me ama com toda a inocência, como um irmão mais novo, ou um filho. Eu teria medo de me ajoelhar ante o altar se acreditasse numa palavra do que os padres dizem, condenado como estou. E mesmo assim, como desejo que houvesse um Deus que me pudesse perdoar, e me fizesse saber que estou perdoado..." (Lancelote em conversa com Morgana, pg. 40, Brumas de Avalon - O Gamo-Rei)
Assim como nos outros livros, o terceiro volume continua discutindo questões relacionadas a religião, paganismo e cristianismo. Coloquei algumas passagens que mostram essas discussões, e as posições dúbias dos personagens, que não sabem em quê acreditar. Provindos de uma cultura "pagã", se debatem entre aquilo que acreditam desde sempre e o que o cristianismo vem apresentar a eles. Durante toda a história ressurgem esses debates, em um momento que destaca essa insegurança e dúvida que recaem sobre toda a corte e a própria população. Ainda existem em algumas regiões o culto à Deusa, enquanto os padres já exercem influência sobre grande parte da população. E, claro, Gwenhwyfar possui importante papel na dispersão dessa religião.
Muitas coisas importantes acontecem nesse volume. Logo no início Gwen descobre sobre o filho de Artur e Morgana. Ela acha que Deus castigou ela e Artur por causa desse grande pecado e por isso ela não havia conseguido engravidar. Artur então é impelido por ela a confessar com o sacerdote e este lhe impõe uma sorte de penitências para que possa se redimir perante Deus, a começar na festa de Pentecostes.
Logo nessa festa, Viviane é assassinada por Balim, que sempre achou que havia matado sua mãe, no livro anterior. A verdade é que sua mãe estava sofrendo muito e Viviane praticou a eutanásia. Viviane é assassinada, o Merlim Taliesin passa mal, Morgana desmaia... é uma confusão só que acaba com a festa de Pentecostes de Artur. Ainda nesse volume Taliesin morre e Kevin assume seu lugar como Merlim da Bretanha.
Morgana é dada em casamento ao velho rei Uriens, de Gales do Norte. Mas antes ela havia se apaixonado por seu filho, Acolon. Daí já se sabe o que acontece. Casada com Uriens, ela se deita também com seu filho, Acolon. No norte ela é rainha e exerce sua influencia sobre Uriens e Acolon, de modo que as festividades de Beltane continuam naquela parte do reino de Artur.
Elaine teve uma filha de Lancelote e, ao final do livro, ela busca a menina para que vá viver em Avalon, conforme o trato estabelecido entre as duas. Nimue é levada então para lá e vive com Raven, longe de todas as outras sacerdotisas. Ela terá, no próximo livro, um papel de grande importância e que destacará a necessidade de ter vivido reclusa.
Assim como os outros livros, este se mostra extremamente instigante! A leitura é gostosa e é praticamente impossível largá-lo antes de terminar!
Passagens interessantes:
"Deus não me recompensou pela minha virtude. O que me faz pensar que ele me poderia castigar? E teve em seguida um pensamento que lhe fez medo: Talvez não exista Deus, nem qualquer dos deuses em ue as pessoas acreditam. Talvez seja tudo uma grande mentira dos padres, para que possam dizer para a humanidade o que fazer, o que não fazer, no que acreditar, dar ordens até mesmo ao rei." (Gwen, pensando em um momento em que estava com Lancelote, pg. 84, grifo da autora)
"Mas eles só são parentes meus, e próximos, pelas leis feitas por cristãos, que querem governar esta terra... Governá-la com uma tirania nova - não só querem fazer as leis, mas também dominar a mente, o coração e a alma. E estou eu sofrendo, na minha vida, toda a tirania dessa lei, para que, como sacerdotisa, saiba por que ela deve ser derrubada?" (Pensamentos de Morgana, pg. 163).
"Essa fé me parece demasiado simples. A idéia de que basta acreditar que Cristo morreu para nos redimir de todos os nossos pecados, de uma vez por todas... Mas eu conheço demais a verdade, a maneira pela qual a vida funciona, com vidas sucessivas nas quais nós mesmos, e só nós, é que podemos resolver as causas que colocamos em movimento e tentar compesnar o mal que fizemos. Não é lógico que um homem, por mais santo e bendito, pudesse redimir todos os pecados de todos os homens, cometidos em todas as suas eexistências. O que mais poderia explicar porque alguns homens têm tudo, e outros, tão pouco? Não, é uma artimanha cruel dos padres levar os homens a acreditar que têm o ouvido de Deus e que podem perdoar seus pecados, em nome dele. Ah, eu gostaria que fosse verdade. E alguns padres são homens bons e sinceros." (Lancelote em conversa com Morgana, pg. 198).
Esta edição: BRADLEY, Marion Zimmer. As Brumas de Avalon - O Gamo-Rei. Rio de Janeiro: Imago, 1985.
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