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Sunday, December 8, 2013

SAÍ CEDO, LEVEI MEU CACHORRO - Kate Atkinson

"Talvez não tivesse perdido o bebê se não tivesse perdido o pai dele. Talvez tivesse sido o estresse. Ela havia começado a comprar roupinhas, luvinhas e sapatinhos. Tilly guardara uma das pequenas luvas durante anos, no fundo da bolsa, até que se desintegrara. Era realmente uma tolice.
A estação de Leeds era um caos; tantas pessoas correndo de um lado para o outro, os rostos sombrios. Todos correndo para pegar o trem, impacientes uns com os outros, consigo mesmos. Dando cotoveladas e empurrando. Que falta de maneiras!
As torres altas, os palácios gloriosos. Era tudo faz de conta, não era? A realidade, em si, não era nada. Palavras, tudo era feito de palavras, e quando você perdia as palavras, perdia o mundo. A tempestade que rugia ao redor dela. No alto-mar, em meio a uma ventania. Os homens nos barcos, o corpo neles batendo contra as águas geladas, depois de serem torpedeados. Afundando, afundando, afundando." (pg. 326, sobre Tilly e seus devaneios)
O livro é bem tranquilo de ler, linguajar fácil, um suspense. A dificuldade que senti foi a quantidade de nomes! Muitos personagens, com nomes nem tão fáceis de guardar. Mas acho que isso acontece porque a autora começa a história com uma cena em particular e, a partir dela, vai descrevendo a vida de vários dos personagens. Então isso torna, no princípio, um pouco confusa toda a trama. Mas depois que se pega o jeito da escrita é mais tranquilo. 

Trata-se de uma obra que dá bastante destaque a três temas em especial: sequestro de crianças, corrupção na polícia e problemas de memória na velhice (não sei o nome específico rs). A história gira, basicamente, em torno de um crime que aconteceu há muito tempo (35 anos antes do presente considerado no livro), um assassinato de uma prostituta e uma criança que é encontrada viva na cena do crime. A partir daí os personagens vão se encontrando, recontando o passado e construindo novas momentos. Há dois detetives que acabam se encontrando, trabalhando para clientes diferentes, buscando informações sobre o assassinato. A presença dos detetives - 'alguém fazendo perguntas' - deixa todos os envolvidos no episódio muito desconfortáveis, e momentos de violência e fuga passam a fazer parte do enredo. 

É um livro interessante. Quem quiser algo para distrair, essa é a dica. Alguns trechos do livro: 

"- Está aberto a interpretações, claro - disse ela. - Significa que a morte está aqui, mesmo neste simples paraíso, isto é, não há como escapar dela, colega. Um memento mori, por assim dizer, uma coisa tipo 'já fui um dia o que você é agora´. Ou significa que a pessoa que está morta também aproveitou as coisas boas da vida um dia, o que no fundo é a mesma mensagem. De um jeito ou de outro, estamos todos condenados. Mas, é claro, e isso é bem irritante, essa coisa toda ficou confusa depois daquela baboseira de Código Da Vinci." (pg. 46, Julia conversando)

"Você não pode mudar o passado, apenas o futuro, e o único lugar em que você podia mudar o futuro era no presente. É isso que eles diziam. Tilly não achava que alguma vez tivesse mudado alguma coisa. Exceto sua opinião." (pg. 30, Tilly pensando sobre sua vida)

"Quando a menina falasse alemão bem o suficiente para explicar sua situação para alguém, provavelmente já teria esquecido a mãe. Crianças esquecem rápido; é um mecanismo de proteção. Jackson os encontrarra muito mais rapidamente do que a engrenagem lenta da burocracia alemã teria sido capaz." (pg. 267, Jackson pensando sobre as crianças sequestradas)

"Sentia-se satisfeita pela cena parecer tão convincente; era tudo fingimento. Atuar, encaremos os fatos, era algo tolo. E tudo era uma tolice nos dias de hoje. Tudo era fingimento. Nada mais era real. Não havia profundidade. E pronto." (pg. 198, Tilly pensando sobre sua carreira de atriz)

Essa edição: ATKINSON, K. Saí cedo, levei meu cachorro. São Paulo: Editora Fundamento Educacional, 2013.